O Motim do Skylab

Tecnologia

O ano é 1973. Com o fim do programa Apollo, o governo americano está satisfeito com sua conquista política e, em vez de buscar pesquisas adicionais sobre exploração lunar  de uma forma cada vez mais econômica, eles decidem cancelar todas as futuras missões lunares.  Em grande parte também pelo corte no orçamento.

No entanto, alguns foguetes Saturno V não utilizados e anteriormente dedicados à Apollo 18, 19 e 20, ainda permaneceram.   A NASA decidiu se adaptar à situação, manter os trabalhadores empregados e lançar a primeira estação espacial dos Estados Unidos. Assim nasceu o Skylab.

Os Estados Unidos, por assim dizer, não estavam familiarizados com a logística da pesquisa de estações espaciais ou com missões de alta duração. Também não havia exatamente muitos dados sobre o assunto. A única outra estação espacial que existia foi a soviética Salyut 1, que saiu de órbita apenas 6 meses após o lançamento forçando o regresso da tripulação da Soyuz 11 em 1971 (os três tripulantes chegaram mortos ao solo, provavelmente asfixiados, depois de passar 22 dias na estação soviética).

No entanto, a NASA estava ansiosa para começar a pesquisar em órbita baixa da Terra. Todas as três missões de pesquisa tripuladas da Skylab foram iniciadas no mesmo ano em que a estação foi lançada em órbita.

O Skylab 4 foi lançado em 16 de novembro, com a tripulação padrão de 3 pessoas das missões anteriores. Desta vez, o elenco foi Gerald P. Carr, Edward G. Gibson, e William R. Pogue.


Imagem: (Carr, Gibson e Pogue, respectivamente, da esquerda para a direita.)

Porém, os três astronautas eram novatos. Em cada uma das missões anteriores do Skylab, havia pelo menos um astronauta experiente: O Skylab 2 tinha Charles Conrad Jr, e o Skylab 3 tinha Alan Bean, ambos astronautas da Apollo. Enquanto cada um dos membros da equipe do Skylab 4 eram pesquisadores e pilotos experientes, nenhum deles jamais havia estado no espaço antes.

Além disso, o Skylab 4 previa o maior tempo de permanência no espaço. O Skylab 3 já estava avançando, com uma duração de missão quase o dobro da do Skylab 2, quebrando o recorde na época com 60 dias no espaço. O Skylab 4 queria 84 dias, ou 12 semanas no total.

Com esses novatos, as tensões aumentaram com o passar das semanas. A tripulação, desacostumada à grande carga de trabalho e à longa duração da missão, começou a se desesperar. O moral caiu ainda mais, pois o controle da missão era o único administrador e planejador dos detalhes da missão. A equipe começou a protestar contra a enorme carga de trabalho e a micro-gestão, entende-se como a pouca autoridade deles na missão.

“Nunca trabalharíamos 16 horas por dia durante 84 dias seguidos em terra e não devem esperar que o façamos aqui no espaço”, disse Gerald Carr ao controle da missão.

O controle da missão não deu atenção às reclamações da tripulação do Skylab, citando o trabalho excepcional das missões anteriores. Eles pressionaram a equipe do Skylab 4 a trabalhar ainda mais para compensar o tempo perdido. Isso só fez as tensões aumentarem.

Finalmente, em 28 de dezembro, 42 dias no Skylab 4, a equipe enviou uma mensagem singular para o controle da missão.

“Precisamos de mais tempo para descansar. Precisamos de um cronograma que não seja tão carregado. Não queremos nos exercitar após uma refeição. Precisamos controlar as coisas”, disse Gerald Carr ao controle da missão.

Mais uma vez, o controle da missão não deu muita atenção e ainda tentou subestimar a situação enviando outra mensagem de volta, pedindo à tripulação que seguisse o cronograma de trabalho.

Não houve resposta do outro lado do rádio, pois Carr desligou todas as comunicações.

O controle de solo entrou em pânico total. Não ter contato de rádio com uma tripulação no espaço não era apenas perigoso, mas um grande desperdício. Em 2017, um dia de tripulação a bordo do Skylab valia cerca de 22 milhões de dólares. Cada minuto sem contato via rádio vinha com uma grande perda de oportunidades.

Enquanto isso, a tripulação do Skylab 4 estava tendo o dia mais agradável em semanas. Carr e Pogue passaram o dia olhando pela janela para a Terra e a Lua desde a órbita, enquanto almoçavam no ritmo mais calmo desde o início da missão. Gibson passou seu tempo trabalhando em experimentos em que ele queria realmente trabalhar  e passou o dia sozinho mexendo no console solar da Skylab.

No dia seguinte, quando Carr reativou as comunicações, o controle estava notavelmente mais compreensivo. Com a tripulação do Skylab 4 mantendo milhões de dólares por dia como reféns, eles começaram a reconhecer as necessidades psicológicas da tripulação.

As negociações começaram e as mudanças entraram em vigor: a partir daquele dia, o controle forneceria à tripulação uma lista diária de tarefas que eles deveriam realizar na ordem que desejassem, o que era um passo à frente do micro-gerenciamento que eles haviam experimentado antes. Além disso, a equipe teria tempo para refeições, em vez de terem que comer quando era possível ou enquanto trabalhavam. Em troca, o controle estabeleceu um novo protocolo para futuras missões da estação espacial, incluindo uma regra que proibia uma equipe apenas de novatos. Essas regras mais tarde influenciariam a escolha da tripulação e os cronogramas da Estação Espacial Internacional.

Com o novo cronograma estabelecido, o Skylab 4 rapidamente se tornou a missão da estação espacial mais produtiva da época, com os resultados da pesquisa coletados durante o período de 12 semanas superando amplamente qualquer das missões Skylab anteriores.

Além disso, o Skylab 4 forneceu informações sobre as necessidades psicológicas dos astronautas, particularmente durante missões de duração prolongada. Para a NASA, a missão serviu de alerta para o bem-estar dos pesquisadores no espaço. O episódio forneceu dados que se tornariam fundamentais para o futuro protocolo de estações espaciais, como o MIR e a ISS, e se tornou um tópico de conversa sobre viagens espaciais de longo prazo, incluindo a de outros planetas.

Como os astronautas seriam capazes de lidar com o longo tempo de viagem entre a Terra e Marte? O que o trabalho em um espaço confinado por períodos tão longos faz com a mentalidade de uma pessoa?

Graças em parte ao caso peculiar do Skylab 4, agora temos respostas um pouco melhores para essas perguntas.

Partes deste texto foram adaptadas e/ou retiradas de publicações diversas

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